quinta-feira, 12 de julho de 2012

Literatura nativa escrita por índios

Por Olívio Jecupé

[Escritor de literatura nativa e poeta. Presidente da Associação Guarani Nhe´e Porã, morador da aldeia Krukutu, São Paulo- Parelheiros-SP]



Sei que no passado por exemplo nos anos de 1970 não se conhecia autores indígenas com livros publicados no Brasil, mas hoje está muito diferente porque temos vários escritores indígenas que escrevem e têm livros publicados, ou textos em revistas. Isso é muito bom porque mostramos ao mundo que não somos só contadores de história oral, mas pessoas capacitadas que têm a sabedoria de escrever belas histórias. Por isso hoje podemos ver grandes escritores indígenas, como, Darlene Taukane, Manoel Moura, Giselda Jerá, Jeguaka Mirim, Adão Tataendy, Cristino Wapichana, Eliane Potiguara, Jaime Dessano, Rosi Tapuia, e tantos outros que poderia mostrar aqui nesse texto. 

Sendo assim, acredito que a literatura nativa escrita por nós, é muito importante porque vai chegar até os não índios e fará com que a sociedade conheça melhor os povos indígenas, e com isso vai valorizar mais a gente em geral. 
E nossa escrita mostrará ao mundo a nossa capacidade de escrever, pois o povo indígena sempre foi mal visto como incapaz. E através dela, podemos mostrar que nós também somos capazes de termos nossos livros publicados. 
Quando eu iniciei a escrever em 1984, eu não conhecia nenhum escritor indígena com livro publicado, aliás as editoras não davam muito valor sobre isso, e agora parece que está mudando essa mentalidade, pois as editoras estão publicando mais livros sobre o tema indígena. Isso é bom porque com a nova lei 11.645, onde terá que falar sobre os povos indígenas, os professores terão mais assunto para discutir, e melhor, mais conhecimento para ser discutido nas salas de aula. Sei que antes os professores falavam sobre os povos indígenas, mas não tinha muitos livros sobre essa questão. Por isso, nós índios temos que escrever mesmo, e com sabedoria, porque, levaremos nosso conhecimento ao mundo. 
Também, quero dizer que será importante para nossas aldeias, porque nas aldeias chega muitos livros enviados pelas secretarias de educação, mas livros que não é sobre índios. E a partir de agora eles poderão enviar livros de autores indígenas, para que as crianças tenham mais conhecimento sobre os temas que chegarem. 
Mas sei que muitos na cidade acham engraçado ver um índio escritor com livros publicados, muitos viam o índio como atrasado, agora que escrevem, vêem com outro preconceito, até dizem que não são índios porque índio é contador de história oral. E nós índios temos que entender que na sociedade não indígena nem todos entenderão nosso ponto de vista, mas devemos escrever mesmo recebendo críticas deles porque muitos outros irão nos entender e nos valorizar. 
Aliás, antes eu sofri muito por não ser entendido, e hoje muitos me valorizam e juntos valorizam nosso povo indígena, é que a sociedade é complexa, se um índio faz uma coisa errada, eles dizem que os índios são assim, por isso, quando eles valorizam um índio escritor, aí valorizam os índios. 
Também gostaria de dizer que hoje mudou muito no Brasil, temos escolas dentro da própria aldeia e nossas crianças aprendem a ler e escrever, aliás, nas duas línguas, português e na língua nativa, por exemplo, na aldeia krukutu, onde moro, escrevem em guarani e português. E nossas crianças continuam ouvindo história oral junto com seus pais, e, sendo assim, surgirão muitos autores e que poderão publicar livros também, e acredito que em breve teremos muitos escritores indígenas, o que facilitará mais a sociedade a nos compreender melhor. Como exemplo, eu tenho alguns filhos e quero citar um exemplo, tenho um que se chama Jeguaka Mirim, que nasceu em 2001 e desde pequeno ele gostava de ouvir história e sempre eu contava alguma pra ele antes de dormir, aí com 6 anos ele entrou na escola e logo aprendeu a ler, com isso ele começou a ler meus livros, isso me deixou contente, porque vi que gostava de ler, aí com oito anos ele pegou um caderno e começou a escrever algo, depois ele quis digitar no notebook, e pude ver que ele tinha talento para escrever, agora posso dizer que ele é escritor, e já tem um contrato assinado com uma editora e em breve o Brasil irá conhecer o pequeno guarani escritor. Por isso, sei que outros kurumins no Brasil poderão publicar um livro também, e por isso que é importante que a sociedade apoie os povos indígenas escritores. 
E como eu sou escritor gostaria de comentar um pouco de cada livro, primeiro que falarei é:

  • 500 anos de Angústia: é um livro de poesias e que pelo título dá pra perceber que é uma critica aos 5oo anos de sofrimento por tantos problemas sofridos nesses séculos de invasão. 
  • Verá o contador de história: é um livro em que eu uso um kunumi-menino e que tem o dom de criar e contar histórias, pois muitos sempre imaginam que os velhos são os contadores , mas na verdade quem conta história já nasce com esse talento. 
  • Iarandu o cão falante: já nesse livro eu mostro algo interessante, pois muitos dizem que os animais não pensam, e através de um cachorro que é iarandu, um gênio, irá conversar com um garoto e trocará ideias filosóficas e quem ler esse livro poderá entender melhor os cachorros. 
  • Xerekó arandu a morte de Kretã: esse livro mostra a história de um dos maiores líderes, foi o primeiro vereador do Brasil, e lutou muito para defender seu povo e em 1980, a mando de quem não queria o bem dos índios, mandaram matá-lo. É um livro emocionante e choro todas as vezes que leio. 
  • O saci verdadeiro: quero dizer que o saci é um personagem indígena e que tem duas pernas e é o protetor da floresta, é conhecido como Kamba'i ou Jaxy Jatere. E sou o primeiro no Brasil a escrever essa história desse personagem. 
  • Ajuda do Saci: mostro uma aldeia em que não havia escola e um dos kunumi deseja estudar e aí para realizar seu sonho irá morar na cidade de uma família amiga, ficará lá três anos, até que acontecerá algo triste com ele e ficará paraplégico e terá que voltar para a aldeia e sua tristeza chega até o Saci (Jaxy Jaterê) - e nisso vocês conhecerão um pouco mais sobre o que acontecerá depois, é um livro que está traduzido em guarani. 
  • Arandu ymanguaré: esse livro é pequeno mas grande nas ideias, e nele tem um pequeno momento de perguntas e respostas e algumas histórias, fico feliz por ter recebido muitos elogios dos que leram esse trabalho e espero que você também se sinta feliz ao ler. 
  • Indiografie: esse livro foi publicado na Itália e fiz o lançamento em Roma e outras cidades. Eu havia sido convidado para publicar um livro e nisso resolvi que fosse uma coletânea e aí convidei outros autores indígenas para fazer parte, achei importante porque acredito que os leitores de lá iam gostar muito dessa ideia. E gostaram mesmo, disseram eles nos eventos que fiz. -Literatura escrita pelos povos indígenas: Nesse livro eu tento mostrar um pouco de minhas experiências que tive desde que iniciei a escrever nos anos de 1984 e como anda hoje a literatura nativa escrita por mim e outros autores -Tekoa conhecendo uma aldeia indígena: Nesse livro eu uso um menino da cidade que deseja conhecer uma aldeia e no tempo que ele vai ficar na aldeia, irá conhecer o dia a dia de uma comunidade, e volta feliz por conhecer uma cultura diferente da sua e notará que o índio não é inferior, mas diferente culturalmente. 
  • A mulher que virou urutau: Esse livro é um mito contado nas aldeias guarani, nele mostra a história do lua e a história de uma moça que se apaixonou por ele. É um livro bilíngue, em português e guarani.

1 comentário:

XXXXXXXX disse...

Parabens pelo texto! Que cada vez mais a UFSCAR se abra aos indigenas, como tem feito nos ultimos anos! Marcos Aguiar